Saúde do trabalhador: uma gota de sangue em cada produto

O ritmo intenso de crescimento da economia é inegavelmente um benefício para os trabalhadores, mas também escancara outra mazela histórica da produção capitalista que, no Brasil, põe uma gota de sangue em cada produto que chega ao mercado: os altos índices de insegurança e insalubridade no trabalho.

A reportagem recém-publicada neste portal (“Exploração e doença do trabalho fazem a fortuna do agronegócio”, de Leonardo Severo) é um exemplo candente deste drama que envolve milhares de trabalhadores colhidos por jornadas de trabalho exaustivas, ritmos intensos, exposição a ambientes insalubres e estressantes e a condições de grande periculosidade – tudo isso para intensificar os lucros do capital e engordar as contas bancárias dos empresários.

O foco do relato feito por Leonardo Severo não é nenhuma empresa pequena ou anacrônica. Ele conta a história das doenças adquiridas por uma trabalhadora de uma moderna empresa multinacional, que usa tecnologia de ponta e emprega formas “modernas” de gerenciamento do trabalho; “modernas” pela intensidade exigida dos trabalhadores, pelas maneiras de conquistar sua adesão ao espírito da empresa e também pelas táticas usadas para ocultar as irregularidades durante as fiscalizações e subtrair os trabalhadores à assistência médica e previdenciária a que têm direito.

Trata-se nada menos da Seara que, em 2009, foi comprada pelo grupo Mafrig, uma das modernas multinacionais brasileiras fortalecidas nos últimos anos, inclusive com recursos do BNDES. Ela é, entre outras coisas, como informa sua página eletrônica, a quarta maior produtora mundial de carnes, e o segundo maior frigorífico brasileiro, com um faturamento estimado em R$ 28 bilhões. É uma empresa globalizada, presente em 22 países, inclusive nos EUA e na Europa.

Empresa moderna, métodos de exploração arcaicos – esta pode ser a receita de sucesso, como a de muitas outras empresas que crescem à custa da saúde de seus trabalhadores. A denúncia contra a Seara é apenas um caso de malefícios contra os trabalhadores que não param de crescer.

Dados do Ministério do Trabalho e do Emprego traçam um quadro tenebroso quando se trata de segurança e saúde no trabalho. Um exemplo: entre janeiro e abril de 2011 foram feitas 42.420 fiscalizações em todo o país que resultaram em 19.234 autuações. Isto é, em quase metade das empresas (45%), a fiscalização iniciou um processo.

Quando se examina aqueles números por setor, o retrato da exploração capitalista fica mais nítido. Por exemplo, na agricultura, das 2.601 empresas fiscalizadas, 2.165 foram autuadas (83%); na indústria, a química foi a campeã (com 71% de autuações), seguida pela construção civil (69%) e de alimentos, como a Seara (67%); a indústria metalúrgica não fica muito atrás (62%). Na área de serviços, a insalubridade é tão acentuada como a de setores “tradicionais”; um exemplo são as instituições financeiras, onde houve 62% de autuações pela fiscalização, que constatou más condições de trabalho, ou nas próprias instituições de saúde (hospitais, clínicas, laboratórios, etc.), onde mais da metade (55%) foi autuada pelas mesmas abjetas razões.

O Ministério informa também que as doenças mais frequentes (80%) decorrem de ritmo intenso, de trabalho repetitivo e das pressões exercidas contra os funcionários. Elas colocam em destaque as Lesões por Esforço Repetitivo (LER), os Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT), que é o caso da trabalhadora da Seara cuja história foi relatada pela reportagem, além de estresse, ansiedade e sedentarismo.

O lado trágico dessa exploração desmedida é ilustrado com cores fortes pelas estatísticas da Previdência Social, segundo as quais em 2009 ocorreram 723,5 mil acidentes de trabalho no Brasil, resultando em 2,5 mil mortes (sete por dia).

O Brasil precisa crescer e o caminho para isso é a mobilização das forças nacionais voltadas à produção. E o crescimento econômico precisa ser partilhado com os trabalhadores, que são aqueles que transformam matérias primas em produtos úteis para todos.

Mas a valorização do trabalho precisa ir além da necessária criação de novas vagas e da valorização do salário. Faz parte dela também a criação, nos locais de trabalho, de condições dignas, saudáveis e seguras para que os trabalhadores possam desempenhar suas funções e se beneficiarem, com saúde, dos produtos de seu trabalho.

 

Fonte: Vermelho

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